Kung Fu, um sentindo mais amplo

Kung Fu, um sentindo mais amplo

kung-fu-um-sentindo-mais-amplo, neste video Grão-Mestre Leo Imamura fala um pouco sobre sua jornada dentro do Kung Fu e sua percepção.

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Foi numa manhã ensolarada de Primavera que tive a honra de ser aceito na Família Moy Yat do Clã Ip Man do Sistema Ving Tsun ( Wing Chun ).

As primeiras palavras de seu líder, Patriarca Moy Yat, logo após anunciar sua decisão de acolher-me em sua família, esclareceram de pronto a natureza da minha jornada: “Que fique claro: aqui, você irá aprender Kung Fu e não técnicas de Kung Fu”.

Essa advertência me veio à mente quando li o livro A História do Pensamento Chinês, onde a Professora Anne Cheng escreveu que o termo Kung Fu foi popularizado num sentido um tanto redutor pelo gênero cinematográfico de mesmo nome. É esse “sentido um tanto redutor” do termo kung fu que encontramos em dicionários como o nosso Houaiss, onde a palavra Kung Fu é definida de modo bem limitado, referindo-se como arte marcial chinesa que remonta ao período da dinastia Chou , simultaneamente forma de cultura física, técnica de desenvolvimento espiritual baseada em exercícios de concentração e instrumento de defesa pessoal.

Entretanto, tradicionalmente na China, esse termo era usado de maneira muito mais ampla. Basta consultar o dicionário de Lin Yu Tang’s, para verificar como Kung Fu pode ser entendido de uma maneira mais abrangente:

1. Tempo e energia despendidos num trabalho

2. Grau de perfeição obtido em qualquer linha de trabalho. Doutora Cheng parece corroborar com o dicionário organizado por Doutor Lin, quando escreve que a ideia de Kung Fu, na China, está ligada a toda prática ao mesmo tempo física e espiritual e designa o tempo e a energia que se dedica a uma prática com a finalidade de atingir um certo nível, tratando-se de uma forma de aprendizado manifestada num “saber-fazer” que não se transmite pelas palavras.

É sobre um entendimento mais amplo sobre o termo Kung Fu que iremos discutir hoje neste nosso encontro na Vida Kung Fu. Fizemos uma entrevista com o Professor François Jullien em seu escritório na Universidade de Paris, onde ele aprofundou mais sobre o tema Kung Fu, quando ele mencionou que a noção de Kung Fu dizia respeito à passagem espontânea da dificuldade para facilidade. Segundo ele, a noção de Kung Fu pode ser tomada como “investimento paciente de onde resulta e amadurece a facilidade”. Essa transformação, – que advém do esforço em não forçar e reverte a dificuldade em seu contrário ( ou seja a facilidade), é o resultado despercebido de um investimento.

É a transformação silenciosa. Nesse investimento que foi feito, algo progressivamente amadureceu, que é o contrário da dificuldade, e faz com que o fruto desse amadurecimento venha por si mesmo. Doutor Jullien chama isso de “imanência” e ela chega naturalmente, sem pensar.

Para ele, não há um equivalente à noção de Kung Fu no pensamento ocidental, se considerarmos a análise do investimento do esforço e sua transformação em seu contrário. Neste momento, quero compartilhar a minha visão sobre o trabalho do Professor Peimin Ni. Meu interesse sobre o seu trabalho vem da visão de considerar os clássicos chineses como obras que ele chama de Instrução Kung Fu. Acho interessante apresentar o olhar do Doutor Ni, pois o trabalho dele ganhou grande repercussão quando escreveu artigo “Kung Fu 功夫 for Philosophers” no The Opinionator, um blog do New York Times.

Segundo o Professor Peimin Ni, a essência do Kung Fu pode ser encontrada em várias artes e orientações sobre como cultivar a pessoa e sua vida. Eruditos do Neoconfucianismo usavam o termo Kung Fu sob diferentes significados. Baseado na constatação da ampla abrangência do termo, ele elencou os seguintes empregos para esta noção:

(1) esforços dispendidos em algo, (2) modos apropriados de realizar esforços empregando tempo ou instruções particulares sobre como realizar tais esforços, sentido no qual podemos falar sobre Kung Fu como uma forma de arte, (3) incorporação das habilidades resultantes destes esforços, e (4) os propósitos das habilidades alcançadas. Para ele, o Kung Fu permite perceber a união do homem à ação de uma maneira que a ação humana não é tratada meramente como um resultado de escolhas racionais ou procedimentos técnicos, mas como resultado do cultivo humano.

Professor Ni é autor de diferentes expressões como Perspectiva Kung Fu e Dimensão Kung Fu, nos quais ele se refere como uma abordagem pragmática com uma clara ênfase no cultivo e na transformação da pessoa. Ele nos explica que um mestre de Kung Fu faz boas escolhas e usa efetivamente seus recursos com base na sua pessoa como um todo, incluindo seus sentimentos, e que sua excelência é manifestada não só pelas consequências da ação, mas também pelo estilo artístico que é realizado.

É minha opinião que a noção de Kung Fu passou a chamar atenção dos especialistas a partir da propagação do seu “sentido um tanto redutor”, ou seja, “Kung Fu como arte marcial chinesa que depois se estendeu para um gênero cinematográfico”. Por isso que é nosso compromisso trazer um entendimento mais amplo de Kung Fu para as gerações futuras.

 

 

 

 

 

 

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